segunda-feira, 3 de maio de 2010

Dessas derrotas que me fazem vencedora

"Gosto das perdas que me tiram tudo. Pra sentar em mim, olhar ao redor, e ficar. Até redescobrir em mim força e possibilidades de recomeçar. Tudo que vivi já me ampliou os vãos de dentro, e tanto, que me sinto tão menor em mim. Mas, com espaços para crescer."
    
Cecília Braga
    
Gosto de perdas que desertificam a alma. Perdas que me deixam desabitada, que me despovoam de serenidade, desolando-me de mim mesma. Perdas que me banham com tempestades de areia, empoeirando o olhar e arranhando os lábios, que deixam o caminho arenoso e embaçam o horizonte com uma densa cortina de poeira. Perdas que me refrescam com feixes tremeluzentes de raios de Sol, marcando a face e ressecando a pele, que deixam as estradas à mercê do tempo desprotegidas de sombras e o solo rachado. Gosto de desilusões que amarelecem os sonhos. Desilusões que murcham as flores multicoloridas da fantasia, que podam as folhas verdejantes da esperança, que apodrecem a fé. Desilusões que cultivam em mim um Outono em meio a Primavera, florescendo a descrença, fazendo-me ferir as mãos com os espinhos que colho. Desilusões que me fartam da ausência de frutos, alimentando-me com fomes insaciáveis, saboreio-me com a triste beleza dos galhos secos. Gosto de dores que esmigalham o coração. Dores que me fragmentam, que arrancam pedaços meus a solavancos, que me esmagam. Dores que me embalam - minúscula, amiúde - numa caixinha de tristeza. Dores que nublam os risos, serenando melancolia. Gosto de decepções que rasgam os sentimentos. Decepções que me retalham, que me rompem, que me descosturam. Decepções que bordam aspereza no tecido de seda da vida. Decepções que deixam a delicada costura do 'acreditar' sem arremate.
Gosto da pobreza que acompanha os fracassos. Do silêncio das derrotas. Das ventanias que me varrem. Da nudez da estiagem. Da inconstância da intempérie. A ausência da balbúrdia das vitórias faz com que eu redescubra a força que dorme dentro de mim. Perder é a minha mais nobre vitória porque eu alicerço sobre minhas derrotas o desejo de recomeçar. E quanto mais pequenina pareço mais cresço - serena, silenciosa. Enlargueço a moradia cá dentro para que eu continue crescendo mesmo quando golpes lá fora quiserem me apequenar. E quando eu parecer pequena jamais me julgue mesquinha porque estarei tecendo grandeza, sem pressa, nas coisas singelas.

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